Dominantes - UMA BATALHA ETERNA - CAP. 3  

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Capítulo 3: “Eu sou a próxima vítima!”


O sol ainda apresentava os seus primeiros raios de luz quando Marcos chegou a delegacia. Não conseguira dormir bem, pensando nas últimas palavras de Ramiro antes de deixar o local do crime. Crime... a palavra lhe surgiu instintiva na mente, mas será que houve realmente um crime? Que tipo de evidência o local poderia lhe oferecer para que alguma conclusão factível pudesse ser feita?

As respostas começaram a aparecer com a chegada da primeira evidência. As filmagens das câmeras de segurança. Segundo informações da companhia responsável, apenas nove horas de filmagem foram feitas, iniciando-se aproximadamente ao meio dia. Se os depoimentos foram verdadeiros, Marcos poderia assistir a sete horas de gravações antes da presumida vítima chegar ao local. O detetive optou por dividir o conteúdo gravado em três partes, deixando que as seis horas iniciais fossem vistas por seus assistentes, cabendo a ele a análise das últimas três horas de filmagem, o que envolvia a suposta hora do crime.

A principio as filmagens nada trouxeram. Todas as câmeras apresentavam perfeito funcionamento e nenhum movimento pode ser percebido. Após pouco mais de uma hora de filmagem, o detetive pode ver as câmeras da entrada ratificarem o depoimento dos seguranças: Ambos chegaram acompanhando um senhor muito bem vestido, que após uma breve busca foi identificado visualmente como o diretor financeiro da Vobcom, assim como lhe foi dito.

Um dos seguranças entrou a casa, subiu as escadas e colocou as malas do executivo sobre a cama de um dos quartos, sendo vigiado pelo olhar atento de Marcos. “Até então, nada demais”. Em seguida, o segurança sai da casa, se juntando a seu colega de patrulha, do lado de fora. “Vai acontecer a qualquer momento” – pensou
O detetive ainda teve que observar pacientemente por mais trinta minutos o trabalho de Mason Hewey ao computador antes que algo diferente acontecesse.

Finalmente, parecia que o executivo se levantaria da mesa. Foi nesse momento que Marcos se surpreendeu com o término simultâneo de todas as gravações realizadas na sala de estar, que eram exibidas em seu monitor. Fez questão de pausar as demais gravações, acompanhando novamente apenas as filmagens interrompidas, a fim de encontrar algo que ajudasse a identificar o ocorrido. Nada. As gravações simplesmente pararam enquanto exibiam a sala vazia. Observando a gravação daquele mesmo momento pelas câmeras que mostravam a frente do chalé, ainda era possível avistar os seguranças, a pouco mais de cinco metros da porta.

Aproximadamente um minuto depois, foi a vez das câmeras do escritório terem suas gravações interrompidas. Sem mais câmeras internas para observar, Marcos continuou a analisar os seguranças. Após se passarem mais quinze minutos, um dos homens percebeu algo de errado dentro da casa. “O cheiro, talvez?”. Ambos invadiram a casa rapidamente, e com a mesma rapidez saíram.

Um deles saiu cambaleando, possivelmente entorpecido pelo cheiro de queimado, e o outro já estava de celular em punho. “Deve ter ligado para a polícia”. Pacientemente, Marcos acompanhou o término da gravação, que não lhe trouxe nada de novo.

Logo chegaram as análises das demais fitas, onde o único fato relevante foi a presença de duas empregadas, seis horas antes da chegada da vítima. Os seguranças pareciam não ter envolvimento algum no ocorrido, e o fato de quatro câmeras de segurança terem sido derretidas sem qualquer motivo aparente deixava Marcos ainda mais incomodado.

Quase no final do dia, a identidade de Mason Hewey, por análise da arcada dentária, finalmente foi comprovada. O detetive já se preparava para deixar sua sala quando foi surpreendido por Ramiro, transpirando como um porco, e com uma pasta verde nas mãos.

- Você não vai embora sem ver isso chefe, corri muito para te trazer isso

- Senta e respira, homem! – disse Marcos, apontando-lhe a cadeira – Me deixa ver o que é isso.

- Esse primeiro envelope vai complicar a sua cabeça! – disse o perito.

Marcos abriu lentamente a pasta, que continha em seu interior dois envelopes de papel pardo. O primeiro envelope aberto continha uma foto. Uma evidência. A imagem de um fio de cabelo loiro.

- Você quer acabar comigo, Ramiro! Uma outra pessoa na casa?

- E não é cabelo das empregadas. Mas ainda não acabou chefinho, abre o outro envelope.

Atendendo o pedido de Ramiro, o conteúdo do segundo envelope foi revelado, mas Marcos não conseguiu definir ao certo quais eram aqueles impressos.

- São registros telefônicos. De quem?

- São registros das ligações do segurança que ligou para a polícia, e a última folha tem os registros do telefone da vítima. Descobri uma boa! Olha para quem o segurança ligou assim que saiu da casa. O nome do dono do celular está escrito no verso da folha.

- Anthony Cale...esse nome não me é estranho... – disse Marcos.

- É o presidente da Vobcom, Marquinhos! – respondeu Ramiro. Aproveita e olha para quem nosso executivo torrado fez a última ligação de sua vida...Anthony Cale!

Após uma rápida análise das informações recebidas, Marcos até pensou em ligar para a Inglaterra atrás do sujeito, mas o toque do telefone o impediu. Era da recepção do prédio.

- Oi Márcia, me manda uma boa notícia porque o dia está difícil...

- Boa noite, detetive. – disse a recepcionista. Sua voz doce e gentil lhe caiu como um afago, mas definitivamente não era hora para gracejos - É o Sr. Anthony Cale para você. Ele disse estar envolvido em um caso que...

- Como? – interrompeu Marcos, surpreso com a coincidência. – desculpe, Márcia. Eu sei quem é sim. Pode transferir a ligação.

- Detetive. Não se trata de uma ligação, não. Ele está aqui no saguão e gostaria de falar com você!

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Rio de Janeiro, Brasil

Após quinze horas dormindo, o turista foi indelicadamente acordado pelas batidas insistentes na porta do apartamento.

“Será que nem na cobertura da merda desse hotel eu vou ter paz?”

Mesmo estando hospedado em um dos melhores hotéis do estado, se sentiu surpreso ao ser acordado com murros em sua porta. Trajando apenas bermudas, abriu a porta rapidamente, pronto para descarregar sua ira contra aquele que o despertou de seu “breve” descanso.

Porém, tudo o que encontrou foi um envelope branco, que parecia apresentar um grande volume de papéis dentro. Fez questão de esticar o olhar pelo hall de entrada, mas não viu ninguém.

Batendo a porta atrás de si, rasgou o envelope, que não apresentava remetente. Dentro dele encontrou, junto à outros papéis , um envelope menor, contendo apenas seu nome na parte de fora. O conteúdo restante foi identificado em uma rápida passada de olhos como algumas fotos, documentos que mais pareciam dossiês e alguns mapas daqueles feitos pela Internet, dentre outros impressos.

Decidiu começar pela carta, que logo prendeu sua atenção:

Caro Sr. Christopher Kenson,

Me desculpe interromper suas férias, mas o assunto que lhe trago é de urgência para mim.

Você está em dívida comigo. E preciso que pague agora. As minhas ordens seguem abaixo:

- Localize Leonard Opef. Ele agiu contra a minha vontade e deve ser impedido. Faça o que for preciso para que ele o ouça.

- Ele não é mais o guardião do bracelete. Agora você o é. Leonard deve entregá-lo a você.

- Localize o detetive Marcos Alcântara. Ajude-o, e ele o ajudará a chegar até Leonard. Assim que os desígnios acima tenham sido cumpridos, traga o detetive a minha presença.

Todas as informações que você precisa para ser bem sucedido nas tarefas que lhe passei estão no envelope de onde você retirou essa carta. Analise o material com atenção e boa sorte.

Sem mais,
Ingram

Após proferir uma alguns palavrões, chutar uma cadeira e arremessar o envelope do outro lado do quarto, Christopher começou a arrumar as malas.

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- Obrigado por me receber de forma tão solicita, detetive. Estou certo de que posso colaborar muito com a sua investigação. – disse Anthony Cale, em bom português. O jovem presidente da Vobcom parecia à vontade na sala de interrogatório da Polícia Federal. O belo terno negro lhe caía muito bem, realçando seu olhar determinado e seus cabelos, também negros, curtos e bem penteados.

- O senhor deve ter recebido informações do caso com o seu segurança, eu presumo. Não gostaríamos de tê-lo incomodado a ponto de nos fazer uma visita.

- Na verdade, eu soube do caso antes da equipe de segurança me contatar, detetive. E é por isso que estou aqui.

- A última ligação de Hewey... – disse Marcos

- Exatamente. Eu não atendi a ligação, mas uma mensagem foi gravada em minha caixa postal. Gostaria de ouvi-la? – disse Anthony, exibindo seu celular.

- Sem dúvida! – respondeu Marcos, sem disfarçar a satisfação em se deparar com um possível avanço no caso. As evidências não costumavam lhe bater à porta dessa maneira.

Prontamente, Anthony Cale acionou o sistema de viva-voz de seu celular, permitindo que Marcos o acompanhasse no processo de busca pela mensagem em sua caixa-postal.

- É essa – disse o executivo, ao inicio de uma das mensagens. A gravação começara de uma conversa já em curso, mas, com alguns segundos de audição, Marcos já se encontrava situado quanto ao teor da discussão.

- ...eu ajudaria você? – disse uma voz grave e envelhecida. Marcos presumiu ser a voz de Mason Hewey.

- Você não tem escolha, amigo. Você não vai mais ajudar seu chefe a nos prejudicar. – disse a outra voz, também grave, porém muito mais jovem – Eu até poderia queimar seus dados de trabalho, mas eu sei que você conseguiria refazer o serviço e mais cedo ou mais tarde nós estaríamos com problemas novamente. Por isso, estou lhe dando essa chance de abandonar o lado errado.

- Eu não sei se eu dou risada dessa proposta ou se eu te mando a merda, seu demônio desgraçado! – O tom de voz de Mason Hewey se exalta no final da frase – Não há escolha a se fazer! Tudo o que eu faço é para acabar com vocês!

- Você é um velho idiota... – responde a voz mais jovem, demonstrando resignação.

- Antes de você aparecer eu tinha dúvidas se conseguiria todo o dinheiro que precisamos – afirmou Mason - mas sua visita me mostrou que estou no caminho certo! Vou conseguir o dinheiro que a companhia me pediu. E pode falar para quem te mandou aqui que a viagem foi perdida!

- É uma pena, Sr. Hewey. Você é leal demais. Uma pena realmente. Não há chances de conversão para você – Os dizeres da voz mais jovem se tornavam mais altos e audíveis.
“Ele deve ter se aproximado de Hewey...” – pensou Marcos.
- E o que você vai fazer, seu demôn.......AGHHHHH

Com o breve grito de Mason Hewey, a ligação caiu. Marcos se manteve calado por alguns segundos. Anthony Cale lhe olhava fixamente, enquanto recolhia o celular da mesa de interrogatório, colocando-o no bolso da calça. Enfim, Marcos decidiu se pronunciar.

- Sr. Cale, como o senhor deve saber, sem as devidas certificações legais, apenas ouvir o conteúdo dessa mensagem não me dá autorização para utilizá-la. Preciso contatar a embaixada e oficializarmos a sua autorização para uso da mensagem como prova. Precisamos achar esse homem.

- Aí está o ponto, detetive. Eu não autorizo. – afirmou o executivo.

- Desculpe, eu não entendi, Sr. Cale – respondeu Marcos, visivelmente intrigado.

- O senhor já percebeu que esse caso não é um crime comum, não é mesmo, detetive? Pois bem, eu tenho muito mais a dizer ao senhor, mas não o farei oficialmente.

- Eu pensei que poderia contar com o seu auxílio, Sr. Cale... – afirmou Marcos, demonstrando não entender onde o executivo queria chegar.

- E pode, detetive. Estarei na sede nacional da nossa empresa, a sua espera, para lhe esclarecer alguns fatos que com certeza o farão entender melhor o que houve naquele chalé. – disse Anthony, lhe estendendo um cartão de visitas – Se ainda achar que deve continuar seguindo o seu raciocínio atual, não precisa ir. Mas se quiser resolver esse caso, eu recomendo que me procure.

Com essa frase, o presidente da Vobcom se levantou, oferecendo a mão ao detetive e estampando um sorriso forçadamente simpático no rosto. Marcos o cumprimentou, devolvendo o sorriso artificial e conduzindo-o até a porta.

Ainda intrigado e totalmente sem saber o que pensar, Marcos se recosta na mesa de interrogatório. Em poucos minutos, o detetive vê Ramiro adentrar a sala.

- Eu estava ouvindo lá de cima. Você conseguiu tirar alguma coisa do que esse doido disse? – pergunta o perito

- Simplesmente nada. Ele não veio aqui para falar. Mas ele parece saber exatamente o que aconteceu no chalé...

- A empresa do cara é de alta tecnologia, não é? Quem sabe eles não desenvolveram algo que possa fazer aquilo com alguém? Isso explicaria o porquê dele não querer tornar nada oficial. – arrisca Ramiro.

- Pode ser, mas eu prefiro não me prender a nenhuma teoria por enquanto. - responde Marcos - Eu vou até lá amanhã cedo. Vamos ver o que o nosso presidente tem a me dizer!

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Estranho. Tudo muito estranho. A forma com que fora recebido na sede da Vobcom antes mesmo de se apresentar. O jeito apressado com que a recepcionista deixou sua posição para liberar o acesso ao elevador executivo, sem pedir uma identificação sequer.

Marcos tentava não se preocupar, mas todas essas particularidades lhe traziam uma inevitável ansiedade pelo novo encontro com Anthony Cale. Embora tenha escolhido o vigésimo quinto andar, o último botão, ao chegar nesse pavimento o elevador não parou. Após subir por mais alguns metros, finalmente a desaceleração característica foi ouvida.

Quando as portas se abriram, uma brisa gélida invadiu o elevador, fazendo com que um calafrio percorresse o corpo do detetive. Marcos esperava ver uma recepção de alto luxo, com uma bela secretária que lhe anunciaria e lhe avisaria a hora de adentrar o escritório do presidente. Mas, ao invés disso, se deparou com um andar completamente vazio.

O piso negro como ébano, brilhante e amplamente iluminado pelas luzes fluorescentes, exibia o reflexo do detetive. As paredes das laterais do andar eram totalmente preenchidas por espessas cortinas, também negras, complementavam o ar gótico do ambiente. Do outro lado do andar, distante, apenas uma porta, que mais parecia estar posicionada na parede de fundo do andar, lhe dava um palpite sobre a localização do presidente da Vobcom.

Marcos avançou lentamente, percebendo as câmeras nos cantos do andar. Se aproximou da porta, mas não teve tempo de decidir se bateria na porta ou se chamaria pelo nome de seu anfitrião.

- Entre, detetive. - disse Anthony Cale, do lado de dentro.

Marcos girou a maçaneta, e logo identificou o executivo em uma grande cadeira marrom, muito semelhante a uma poltrona. Diante do presidente se encontrava uma mesa de vidro, cheia de documentos por todo os lados. A aparente desordem surpreendeu Marcos, que esperava um local de trabalho mais organizado vindo daquela figura que demonstrava tamanha segurança. Rapidamente o detetive olhou para as duas extremidades da sala, onde viu uma porta dupla à sua esquerda e outra, mais simples, à direita.

- Aquela é minha pequena biblioteca - disse Anthony, apontando para a sala à direita de Marcos - e a outra é o que chamo de minha sala de descompressão. Vamos até lá. Gostaria que ficasse mais a vontade para conversamos.

- Sem problemas - disse Marcos, acompanhando Anthony até a porta dupla.

O novo ambiente exibia alguns sofás de couro, que pareciam fofos e extremamente confortáveis. Ao fundo, um pequeno bar, mas de luxo condizente com o restante do local, pode ser visto. Marcos não conseguiu disfarçar a surpresa com a grande diferença na decoração dos dois ambientes.

- Espero que tenha gostado. Considero esse cômodo um pedaço da minha casa. Aceita alguma coisa para beber? - disse Anthony, servindo-se de um copo de whisky.

- Não, Sr. Cale. Obrigado - respondeu Marcos

- Entendo. Está realmente meio cedo para beber. Sente-se, detetive. Fique a vontade.

Marcos se sentou em um dos sofás, enquanto Anthony se dirigia até sua presença, sentando-se à sua frente.

- Bom, detetive, em primeiro lugar quero me desculpar. Acho que não fui totalmente respeitoso durante meu breve depoimento, mas quero que entenda que sua presença aqui era realmente indispensável.

- Não se preocupe, Sr. Cale...- disse Marcos, com um tom de voz mais amigável.

- Por favor detetive, pode me chamar de Anthony.

- Tudo bem, Sr. Anthony, eu entendo sua preocupação. Mas creio que o Sr. já presuma qual é a minha opinião sobre o envolvimento da imagem da sua empresa nesse crime, não?

- Eu presumo sim, detetive. E você está completamente certo. Mason Hewey morreu porque era meu diretor financeiro. - afirmou o executivo.

- Do jeito que o Sr. fala, faz pensar que o sr. sabe quem matou o seu funcionário. - retrucou Marcos

- Eu não sei quem matou Mason, detetive. Mas eu sei o que o matou e porque o matou.

- Desculpe, Sr. Anthony. Pode ser mais claro?

- Posso sim detetive, mas vou precisar de uma boa dose de paciência e de sua boa vontade. - disse Anthony

- Estou aqui para ou vi, Sr.Anthony.

- Minha pergunta pode parecer estranha, mas ela é fundamental para eu decidir como lhe explico isso. Detetive Marcos, o Sr. acredita em intervenções, digamos, além da nossa compreensão em nosso mundo?

Marcos pareceu inevitavelmente espantado com a pergunta, mas a surpresa logo foi substituída por um sentimento de frustração. "Não acredito que estou ouvindo isso" - pensou.

- Não entendi o propósito da pergunta, Sr. Anthony. O Sr. não vai me dizer que o ocorrido com seu funcionário foi uma intervenção sobrenatural, vai? - questiona Marcos, demonstrando um princípio de irritação.

- Na verdade, detetive, foi exatamente isso.

Marcos se levantou do sofá, olhou para a porta, pensando se não deveria sair dali naquele exato momento.

- Me desculpe, Sr. Anthony. Não quero parecer indelicado, mas não estou vendo um motivo para permanecer aqui, ou no que o Sr. possa me ajudar. Se tiver algo mais a contribuir, gostaria que o fizesse agora, pois tenho que dar seqüência a investigação.

- Detetive, me perdoe se lhe ofendi de alguma forma. A situação realmente não é compatível com uma explicação como a que pretendia lhe dar. O que lhe peço são apenas mais cinco minutos. Não mais do que isso. Mas eu peço que me escute atentamente, e então, se quiser, poderei lhe provar tudo o que vou lhe dizer. Vou provar inclusive que sei o que matou Mason Hewey e qual o motivo do assassinato.

O detetive olhou para cima, como se buscando calma para ouvir aquela história por mais algum tempo. Manteve seus olhos fixos na porta de saída por alguns instantes, e então voltou a se sentar.

- Cinco minutos, Sr. Cale. É o tempo que tenho para sua história.

- Então devo me apressar. Essas criaturas, que Mason costumava chamar de demônios, são capazes de coisas que você não conseguiria sequer conceber pensando usando a sua lógica convencional. Embora eles se pareçam muito com pessoas como nós, eles não são. Mas não vou gastar meus cinco minutos falando dessas criaturas. Quando eu for provar sua existência você entenderá que, como se diz, uma imagem vale mais do que mil palavras. Sobre o porquê de terem assassinado Mason, bem, há alguns anos atrás eu descobri a existência deles, de forma quase acidental. Quando percebi o que eram, não tive dúvida. Comecei a dedicar todos os recursos que podia para saber mais sobre essa ameaça. Pois é isso que são, Sr. Marcos, uma ameaça a todos nós! - Anthony Cale pareceu mais enfático do que gostaria.

O olhar de Marcos com o passar da história tornava-se cada vez menos respeitoso, beirando a piedade nesse momento. "Ele pode duvidar agora. O importante é que está me ouvindo" - pensou o executivo, retomando rapidamente a fala, agora com o seu tom de voz novamente visando uma maior sobriedade.

- Com o tempo, fui sabendo mais detalhes sobre eles e, com isso, necessitei de mais recursos. Foi então que comecei a desviar dinheiro da companhia com a ajuda de Mason que, ao saber do que se tratava, concordou de bom grado em colaborar. Seu papel era maquear os resultados e as disponibilizações de verbas da empresa, escoando recursos para nossas pesquisas. Sinceramente, em alguns momentos até pensei em desistir. Por mais informações que tivéssemos, nunca conseguimos evitar que eles agissem. Mas, aproximadamente três meses atrás, fizemos uma descoberta fantástica que faria tudo mudar. Porém, para que nós pudéssemos colocar o projeto em operação, precisaríamos efetuar um verdadeiro rombo na empresa. E era nisso que Mason estava trabalhando quando foi morto. Logo, meu diretor financeiro foi morto porque era o homem que possibilitaria a conclusão de um projeto que pode por fim a essas criaturas.

Alguns segundos de um silêncio pesado se colocou entre os dois homens. Marcos ouvira atentamente tudo o que lhe foi dito. Em seu íntimo, sua única expectativa era filtrar as insanidades relatadas pelo presidente da Vobcom, garimpando seus dizeres, a fim de ficar apenas com algo que achasse útil de alguma forma. Essas considerações eram sempre feitas com base em seu conhecimento e experiência. Mas, dessa vez, Marcos decidira ouvir uma outra companheira inseparável: sua intuição. E foi baseando-se nela que ele decidiu seguir com o depoimento, tentando extrair algo da, até então, infrutífera manhã.

- Se eu o ouvi bem, Sr. Cale, o senhor admitiu que desviou recursos de sua empresa em um projeto que não visa o interesse de seus acionistas, estou certo? Anthony Cale suspirou em desaprovação com o comentário do detetive. Parecia que o detetive não havia entendido nada do que ele queria passar.

- Espero que tenha ouvido com a mesma atenção as outras informações que lhe passei, detetive. Mas sim, é exatamente isso que você ouviu. Mas o que você queria que eu fizesse? Falasse que existem pessoas por aí capazes de torrar seres humanos com o pensamento? Que eu quero usar o dinheiro da venda de celulares em pesquisas que nada tem a ver com eles? Alguém tinha que fazer, Sr. Marcos. – disse Anthony, de forma agressiva e incisiva. O dedo indicador apontado de forma ameaçadora na direção de Marcos dava ainda mais energia às suas palavras. - E eu não me arrependo de ter sido eu essa pessoa!

Com o gesto desrespeitoso, Marcos se ruborizou, ficando visivelmente irritado. Por um instante, o detetive se permitiu comentar o que ouviu, sem se importar do que pensaria Anthony Cale.

- A sua história não tem o menor cabimento, Sr. Cale. Se o Sr. descobrisse algo "do outro mundo" como o Sr. mesmo diz, com certeza procuraria alguma autoridade competente. Ou o senhor também tem planos de roubar o dinheiro de seus sócios para abrir um departamento para caçar essas criaturas imaginárias? - Marcos havia se segurado demais.

- Mas eu vou provar tudo o que eu falei! – respondeu Anthony, ainda com a voz alterada. O diálogo seguia acalorado.

- Como? - retrucou Marcos, com a mesma veemência.

- Simples, detetive. – Anthony Cale tentou se concentrar para recobrar a calma, mas sua frase, que buscava trazer um pouco de serenidade a conversa soou de uma falsa tranqüilidade. - O senhor terá a chance de ficar frente a frente com o assassino de Mason Hewey. – concluiu - Se ele é um homem comum, bastará ao senhor prendê-lo. Mas acho que logo vai perceber que ele não é um homem comum.

- Isso quer dizer que o Sr. sabe onde encontrá-lo? – O princípio de ira de Marcos se abranda com a surpresa trazida pela naturalidade dos dizeres de Anthony Cale.

- Não, detetive. Mas eu sei que ele quer me encontrar. E sei como atraí-lo. Fique perto de mim, Marcos, e você vai encontrar o seu assassino. Pois eu tenho certeza que eu sou a próxima vítima!


This entry was posted on sexta-feira, março 27, 2009 at 14:29 and is filed under , , , , . You can follow any responses to this entry through the comments feed .

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